Controlando a dificuldade de um jogo 30 de janeiro de 2018

Sempre que se fala de balanceamento de um jogo, em geral pensamos em equilíbrio:

  • os diferentes caminhos para a vitória devem ser igualmente viáveis;
  • as cartas / tiles / recursos devem ter seu custo proporcional ao benefício;
  • os poderes variáveis devem ter força semelhante, e por aí vai.

Mas nos últimos 2 jogos em que trabalhei, o balanceamento mais delicado de fazer não tinha a ver com equilíbrio, e sim com a calibragem da dificuldade.

Tanto o Dead & Breakfast quanto o Dubai estavam bem equilibrados.

Mas embora fossem também fluidos, fáceis de entender e com decisões interessantes, eu notei ao longo dos playtestes que as pessoas tinham grande dificuldade de conseguir fazer coisas interessantes. Como ambos são jogos familiares, essa dificuldade estava maior do que a preferida pelo público do jogo, e isso gerava frustração.

Essa frustração se manifestava ao longo da partida em comentários como “não tem nada de bom pra colocar no meu prédio”, “vou ter que estragar meu planejamento” e outros.

Embora a maioria dos jogadores dissesse que adorou os jogos depois da partida, eu sentia que ficava uma certa angústia por não terem conseguido fazer o que se propuseram.

Comecei a aprender na prática a Teoria do Flow, que diz que para gerar engajamento, o jogo deve propor um desafio que não seja tão fácil que se torne entediante, nem tão difícil que provoque angústia.

Gráfico de flow: Dificuldade de um jogo x Habilidade do jogador

Um exemplo clássico de flow é o Show do Milhão. Quanto mais longe o concorrente vai, mais difíceis ficam as perguntas. Se já começasse com perguntas impossíveis, a imensa maioria das pessoas ia se ver sem a menor chance. Se todas as perguntas fossem fáceis, os mais cabeçudos iam bocejar de tédio (mas agradeceriam pelo milhão fácil).

A escalada de dificuldade não só se adapta à capacidade do concorrente, como aumenta progressivamente a tensão do jogo, tornando-o mais dramático a cada resposta certa.

Dead & Breakfast e Dubai traziam para os jogadores perguntas de 500 mil logo de cara. Mas foi difícil para mim ver isso, pois como playtesto o tempo todo, para mim essas perguntas de 500 mil não eram tão difíceis. Foi preciso assistir ao incômodo dos outros jogadores, para me convencer de que dois jogos aparentemente balanceados geravam mais frustração do que deveriam.

A solução foi mexer nas restrições dos jogos, tornando-os mais permissivos. O balanço é delicado para que a curva de flow não tenda para o outro lado e o jogo perca o desafio. Você aumenta de um lado, tira de outro, testa e observa se o jogo não afrouxou demais.

No final de várias iterações, cheguei nas versões atuais desses jogos, com um desafio compatível com seu tamanho e público: jogos não só curtos e fáceis de aprender, mas também relaxantes, com muitas oportunidades de pontuar e desafios mais prazerosos de cumprir.

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